Confira a entrevista de Murilo Lemos!
A Gestão por Competências é uma técnica amplamente utilizada em diversos setores do mercado. Mas, afinal, o que é gerir pessoas com base em suas competências? Segundo a maior parte dos profissionais de Recursos Humanos, uma metodologia do tipo trata, basicamente, da ideia de que é preciso mapear as competências dos indivíduos para saber onde alocá-los e quais funções eles podem cumprir. Para além disso, parte do pressuposto de que é preciso saber qual competência é necessária para o desempenho adequado de cada função.
É possível refletir sobre a importância de uma gestão por competências pensando em um momento pelo qual todo tipo de empresa ou órgão público passa: a contratação. Vamos a um exemplo? Imagine que seu local de trabalho esteja precisando de um analista de treinamento e que ao mapear o que é necessário para ocupar este cargo, foram definidos alguns filtros:
a) Ter formação na área de Gestão de Pessoas e Recursos Humanos;
b) Ter alguma pós-graduação;
c) Ser aprovado no concurso público referente à função.
Os pré-requisitos para a vaga mostram que a organização tem uma preocupação com o conhecimento dos candidatos, mas será que basta conhecimento para ser um bom analista de treinamento? Segundo a linha da Gestão por Competências, é preciso mapear muito mais do que conhecimento para se chegar ao bom exercício de uma função. Por este motivo, a competência é formada por uma tríade de:
No cotidiano de trabalho é possível ver a importância das habilidades e das atitudes para a boa execução de uma função. É visível, do mesmo modo, que uma gestão por competências provê um auxílio que não está restrito à área de Recrutamento e Seleção: a própria forma de um líder agir pode se basear em uma Gestão por Competências. Isto porque esta técnica é capaz de fomentar o Plano de Carreira, Cargos e Salários, as políticas de promoções, a delegação de tarefas e muito mais.
Neste sentido, é válido se atentar ao fato de que um dos benefícios mais importantes da Gestão por Competências, é a possibilidade de eliminar a subjetividade e o favorecimento nas relações de trabalho. Uma pessoa ser promovida por possuir uma competência essencial à função que irá desempenhar é justo, uma vez que promove um processo decisório que não foi guiado por impressões e achismos, mas sim por evidências.
Mas para que este modelo de gestão seja de fato executado da maneira correta, é preciso assertividade e técnica para mapear as competências. Para tal, exige-se um primeiro momento de descrição: é necessário descrever todas as habilidades, conhecimentos e atitudes para que uma função seja realizada com excelência. Após este passo inicial, é preciso destrinchar como mapear esta competência, como saber se de fato uma pessoa possui as características necessárias para executar uma função. Diante desta questão, é válido atentar-se à variabilidade contextual: competências diferentes requerem modos de avaliação distintos. Normalmente, uma mistura de provas de conhecimento, dinâmicas e testes comportamentais são utilizados para mapear a maior parte das competências.
Conheça algumas técnicas!
a) MBTI: O MBTI, ou Tipologia de Myers-Briggs, é um instrumento utilizado para identificar o tipo psicológico das pessoas, sendo amplamente utilizado como teste de personalidade. A avaliação do MBTI é aplicada por meio de um questionário estruturado que reflete preferências individuais. Com os resultados, é possível encontrar 16 tipos diferentes de personalidades. Tal mapeamento visa ajudar a amenizar problemas, readequar posições e dar opções para que os gestores saibam encontrar a maneira correta de alcançar um objetivo.
b) DISC: O DISC é uma metodologia de avaliação de comportamento que tem como objetivo identificar os perfis dominantes de um indivíduo imerso em um determinado ambiente. A partir de suas características, a avaliação permite analisar quais são os fatores que levam uma pessoa a agir de forma específica no ambiente em que está inserida.
c) PREFERÊNCIA CEREBRAL: Com base na neurociência, a teoria de Ned Herrmann classifica os estilos de pensamento em relação ao lado do cérebro dominante. Segundo o autor, pessoas com lado esquerdo dominante baseiam-se na razão e são descritas como analíticas, lógicas e sequenciais. As com o lado direito dominante baseiam-se na emoção e são mais intuitivas, orientadas por valores e com pensamentos não-lineares. Para Ned Herrmann, as pessoas têm quatro estilos comportamentais: as que pensam mais com o lado racional (organizadoras), as que pensam com o lado emocional (idealizadoras), as que agem mais com o lado esquerdo (ativadoras) e as que agem mais com o lado direito (comunicadoras). O estilo predominante influencia a forma de pensamento e o comportamento das pessoas no seu dia a dia. A teoria pressupõe que é possível ativar os quatro estilos e ir além da preferência.
d) ANCÔRA DE CARREIRA: Segundo Edgar Schein, especialista em desenvolvimento organizacional e ex-professor de Gestão da Sloan School Of Management- MIT, e criador desta definição, as âncoras demonstram quais são as motivações dos profissionais. Para Schein, a relação de trabalho é uma via de mão dupla. A âncora de carreira é “uma combinação de áreas percebidas de competências, motivos e valores dos quais não abrimos mão, representam uma parte do nosso próprio eu”. Um questionário, ao ser respondido, não revelará definitivamente a âncora de carreira de alguém, mas estimulará o seu pensamento e facilitará a discussão com gestores e mentores.
e) ANÁLISE E OBSERVAÇÃO: Paralelamente ao uso de uma ferramenta ou apenas como método, é possível avaliar os colaboradores apensas com observação e análise de comportamentos. Isto deve ser feito de forma estruturada (através de um formulário, por exemplo). Vamos a um exemplo? O cargo X exige iniciativa. Para tanto, é necessário observar se o funcionário assumiu, em algum momento, tarefas que não eram suas; como ele se sentiu ao fazer isso; com qual frequência ele faz isso, quais as razões que o motivaram a tomar esta atitude. Outro exemplo: para determinado cargo é preciso uma pessoa que tenha habilidade para administrar conflitos. Neste caso, é fundamental levantar evidências de alguma discordância no ambiente de trabalho (caso a pessoa não tenha tido nenhuma divergência é um mal sinal, pois mostra que ela foge de conflitos); na sequência, deve-se saber como a pessoa reagiu para resolver o impasse; qual o foco e recursos utilizados na solução do conflito e; como ela se sentiu com esta situação. Importante salientar que as observações dos comportamentos sempre devem focar no que as pessoas já fizeram e como elas reagiram. Não é possível avaliar uma competência de alguém imaginando como a pessoa reagiria diante de uma situação X ou Y. A observação e análise deve ser feita considerando eventos passados e nunca futuros.
Agora que você já sabe os pontos básicos sobre este tipo de gestão, chegou a hora de refletir: é possível trazer a Gestão por Competências ao serviço público? O que esta metodologia teria a acrescentar à Administração Pública? Para responder estas indagações convidamos Murilo Lemos, mestre em Gestão e Políticas Públicas (EAESP/FGV) e X anos experiência em Recursos Humanos na Administração Pública, para uma entrevista. Confira!
Pergunta: O que a Gestão por Competências tem a acrescentar no setor público?
Resposta:
Tradicionalmente a gestão pública tem trabalhado apenas com descrições de cargos (tarefas) e requisitos de escolaridade no desenho de suas vagas. Trabalhar com gestão por competências pode, por exemplo, acrescentar elementos fundamentais como requisitos para certos cargos, habilidades práticas e o perfil psicológico necessário para a boa execução daqueles trabalhos. Isso enriqueceria muito os processos de seleção, gestão de desempenho e desenvolvimento.
Pergunta: Quais os principais métodos para um profissional de RH implantar a Gestão por Competências em uma determinada organização?
Resposta:
Via entrevistas internas ou benchmark com outras organizações similares. O primeiro passo é descrever o perfil de profissional necessário para executar as tarefas contidas em um determinado cargo, mas indo além de escolaridade. É necessário descrever quais atitudes o cargo exige alinhado com as novas perspectivas do órgão, ou seja, para esta função é necessário que a pessoa, além os conhecimentos técnicos, tenha resiliência, comprometimento, gestão de tempo e facilidade para administrar conflitos.
Pergunta: Como a Gestão por Competências influencia a área de Treinamento?
Resposta:
A gestão por competências envolve e leva à integração entre sistemas de Recursos Humanos que muitas vezes andam descolados na gestão pública, como, por exemplo, treinamento e avaliação de desempenho. Na gestão por competências, a avaliação de desempenho fornece subsídios fundamentais para o desenho dos programas de treinamento, seja para suprir carências de competências ou para fortalecer aquelas que já tem um certo nível de maturidade.
Pergunta: A sigla CHA (Conhecimentos, Habilidades e Atitudes) é essencial para uma Gestão por Competências eficaz. É o levantamento de cada um destes atributos que permite mapear uma competência. Como você, enquanto profissional de Recursos Humanos, procede para realizar o mapeamento de cada um destes itens?
Resposta:
Conhecimentos: saber, teoria, provas escritas, títulos, diplomas, certificados.
Habilidades: gestão de desempenho, observação do trabalho desenvolvido, feedback de pares, superiores e subordinados.
Atitudes: testes psicológicos e dinâmicas.
Pergunta: No setor privado, acredita-se que a Gestão por Competências possa desencadear uma remuneração por competência. Você acredita que um tipo de reconhecimento análogo a este poderia ser aplicado no setor público? Como?
Resposta:
É possível desde que se reveja a legislação sobre o assunto. Acredito que as competências possam exercer um papel mais importante na contratação, desenvolvimento e evolução na carreira do que na remuneração.
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Radar IBEGESP Janeiro de 2020