A importância do correto atendimento ao público para a Gestão Pública
Marcos Gross é Doutor em Saúde Pública pela USP com foco em comunicação. Possui mestrado e especialização em Gestão Comunicacional pela USP. Autor do livro ¨Dicas Práticas de Comunicação¨ (Ed.Trevisan) e é diretor da consultoria McGross há 17 anos. Estudou na London School of Business and Finance (Grã-Bretanha). Atende organizações públicas, privadas e do terceiro setor em todo o Brasil.
Há décadas, a iniciativa privada percebeu que, se não houver atendimento com excelência ao cliente, nada se vende. É uma questão de vida ou morte para qualquer negócio. Se não for cativado, o consumidor corre imediatamente para a concorrência.
E o que acontece quando o assunto é atendimento em instituições públicas?Trata-se, basicamente, da mesma coisa, apenas substituindo o termo cliente por ¨cidadão¨.
Uma diferença que podemos destacar é que, na iniciativa privada, o cliente/consumidor tem à sua disposição diversas opções de lojas e compras, enquanto na esfera pública o cidadão – quase sempre – depende de um único órgão para resolver um problema específico.
Assim como os consumidores de produtos, o cidadão chega a uma organização pública com várias necessidades e grandes expectativas de que suas demandas sejam solucionadas. Seja face a face ou por telefone, seu anseio é ser ouvido e compreendido em suas carências. Enfim, espera que do outro lado do balcão ou da linha telefônica encontre alguém que seja capaz de dialogar e tenha empatia por ele em seus momentos de dúvida, angústia ou aflição.
Um produto pode ser substituído na gôndola do supermercado, mas o atendimento pessoal é um momento singular, insubstituível, no qual quem atende estabelece uma conexão única com o atendido. Uma primeira impressão se cristaliza na mente de quem foi atendido e um mau atendimento pode não só causar prejuízos ao cidadão, como gerar danos à imagem do órgão. No momento do atendimento, o atendente representa o órgão público em que trabalha, em uma combinação indissociável, e é seu dever representá-lo de maneira exemplar, buscando, dentro de suas possibilidades, a melhor forma de ajudar o cidadão.
No setor público, o atendimento presencial ao cidadão acontece em vários momentos. Da entrada à saída do local, interagimos com seguranças, recepcionistas, o pessoal dos guichês, os médicos (no caso das organizações de saúde) e os funcionários do setor administrativo em geral. Qualquer gesto de simpatia, mau humor ou expressão de desdém de um funcionário será percebido e avaliado pelo cidadão.
Caso o indivíduo se sinta menosprezado em um desses momentos, a tendência é que divulgue em seu círculo de relações o ocorrido, transmitindo a todos uma imagem negativa do órgão colmo um todo, pois o cidadão comum tende a generalizar uma experiência negativa de relacionamento.
E nunca é demais lembrar que nestes tempos de redes sociais, a notícia se espalha rapidamente através de vídeos, textos e fotos, o que potencializa os imensos estragos causados à imagem do setor público.
Como se vê, o atendimento não é somente responsabilidade dos profissionais de atendimento, mas de todas as pessoas que atuam em uma instituição, pois os processos de trabalho exigem trocas, contato afetivo e interações permanentes com o público.Do ponto de vista emocional, o desafio do atendente é enorme. Ele é uma espécie de pára-choque que se coloca diariamente à frente de pessoas e é constantemente insultado, podendo sofrer assédio (moral e sexual) e, muitas vezes, até agressão física.
Por tudo o que foi aqui exposto, não há dúvida da importância da capacitação do profissional de atendimento que, em seu dia a dia, precisa estar preparado para suportar a pressão e não deixa de ser um ator que, mesmo com seus problemas pessoais e cotidianos, busca no trabalho – na medida do possível – interpretar o papel que lhe cabe no momento do atendimento.
Vale lembrar que:
- No Brasil, o atendente nem sempre conta com recursos materiais ou infraestrutura adequada para desenvolvimento da função, porém o atendimento ao público transcende as atividades ordinárias de uma instituição comum. Atender é uma oportunidade ímpar para o profissional compartilhar experiências, quando exercita a empatia, o respeito ao próximo e o contato diário com diversas pessoas e situações num processo contínuo de aprendizado. Para trabalhar com atendimento, é preciso – acima de tudo - gostar de pessoas.
- Com o advento dos recursos da inteligência artificial, o atendimento telefônico – mediado por pessoas (de carne e osso) – se diferencia pela percepção do atendente e pela sua capacidade de fornecer respostas bem mais flexíveis ao público que os robôs. Devido à formação cultural do nosso povo, existem especificidades que caracterizam o jeito como o brasileiro gosta de ser atendido. Ao contrário do sistema digital, no atendimento à moda brasileira deve haver uma sutil pausa para escutar o outro com atenção, ouvir a respiração da pessoa, perceber as nuances da voz dela e responder à demanda do cidadão de forma humanizada, simpática e criativa.
O atendimento com excelência no setor público jamais pode ser mecânico e burocrático, tal qual um fast food (padronizado e excessivamente protocolar). Quem trabalha com pessoas, tem que sentir prazer em compartilhar experiências com o público. A prática do atendimento está relacionada com a sensibilidade e a sintonia que o atendente estabelece com o atendido, já que atender é compreender o estado emocional do outro.
Por isso que é importante se atentar à comunicação de quem atende e é atendido em cada etapa desse relacionamento. Tanto o cidadão quanto o atendente se revelam por meio da fala, dos gestos e do tom de voz. A fronteira que separa a gentileza do descaso depende da qualidade da comunicação e desse intercâmbio afetivo.
Há olhares carinhosos e preconceituosos, assim como certas posturas corporais podem denotar desleixo ou boa vontade. O volume e o ritmo da voz transmitem, às vezes, um tom debochado e o uso excessivo de gírias pode sinalizar falta de profissionalismo.
Como se vê, a prática do atendimento com excelência exige grandes esforços, e programas de capacitação devem ser incentivados e multiplicados no setor público, de modo a promover o maior dos objetivos: a satisfação do cidadão.
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Radar IBEGESP Julho de 2019