Questões polêmicas sobre Sanções Administrativas na Nova Lei de Licitações

Angela Ortiz

05 mar, 2024 ● 4 minutos

*Artigo de opinião

Saiba o objetivo da sanção no processo de contratação

Este conteúdo faz parte do centro de estudos Licitações e Contratos do IBÊ

Podemos dizer que o papel do processo sancionador não é, em primeiro momento, o de punir o particular. Isso porque a Administração, ao tratar de um processo de responsabilização, na verdade está buscando uma parceria com o privado.

O objetivo da sanção, inicialmente, é exercer um papel educativo, com foco no preventivo, mesmo porque a Administração não busca punir e sim alcançar um resultado eficiente para o seu processo de contratação. Então, a aplicação da sanção não deve ser o objetivo da fiscalização e do processo de responsabilização.

Por sua vez, a Nova Lei de Licitações e Contratos (NLLC) traz modelos diferentes e inovadores de execução contratual, que abre a possibilidade de buscar soluções consensuais na ocorrência de infrações administrativas. Essa nova modelagem permite, além do pagamento de remuneração variável (Art. 144), o contrato de eficiência bem como, eventualmente, uma premiação caso a execução do contrato seja feita de forma eficiente.

Assim, a sanção toma uma dimensão secundária, passando a ser apenas coadjuvante no processo de responsabilização. A intenção, neste caso, é o de conseguir contratos mais eficientes não a partir da aplicação da sanção, não para que o particular tenha medo de um processo sancionador e sim a responsabilidade perante a Administração Pública.

É um novo conceito que vem para moldar uma maturidade institucional, tanto para a Administração, como para o particular, que muitas vezes não se relaciona de forma profissional com a Administração Pública. A NLLC traz ferramentas importantes, que podem fazer com que o particular também alcance essa maturidade, com os chamados incentivos contratuais, como pagamento com bonificação variável.

Mas, o que temos de mais benéfico nas questões processuais, de aplicabilidade imediata?

A NLLC inova ao trazer efeito suspensivo do recurso (Art. 168), prazos processuais mais alargados (Art. 166 e 167), reabilitação (Art. 163), alegações finais (Art. 158, § 2°), prescrição quinquenal (Art. 158, § 4°), declaração de inidoneidade com análise prévia pela Assessoria Jurídica (Art. 156, § 6°), desconsideração da personalidade jurídica (Art. 160) e desconto de multa em eventual parcela pendente de pagamento (Art. 156, § 8°).

E essas novas regras sobre sanções são aplicáveis aos contratos celebrados com base na Lei n° 8.666/93?

Essa é uma pergunta muito recorrente, tendo em vista que muitos contratos foram celebrados eventualmente em janeiro e fevereiro de 2024, porém, a partir de editais de licitação publicados em 2023. Na ocorrência de infração na execução desses contratos, poderá ser aplicado o estabelecido na NLLC? A resposta para essa dúvida admite duas perspectivas.

O artigo 190 da NLLC é claro ao estabelecer que o contrato cujo instrumento tenha sido assinado antes da entrada em vigor da nova lei continuará a ser regido pelas regras previstas na legislação revogada. Uma outra perspectiva, que pode ser influenciada pela interpretação constitucional do inciso 40, do artigo 5° da CF, é o chamado Princípio da Retroatividade Benigna, de que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. Ou seja, para o direito penal é um princípio garantia que a norma mais benéfica deve retroagir para beneficiar o réu, nunca para prejudicar.

A grande discussão é se esse princípio garantia, previsto na CF, deve ser aplicado ou não para o processo administrativo sancionador (de responsabilização). Por sua vez, a AGU editou orientação normativa, onde diz que o regime jurídico das sanções previstas na Lei 14.133/2023, que não é aplicável aos contratos firmados com base na legislação anterior, nem alterará as sanções já aplicadas, ou a serem aplicadas com fundamento na legislação anterior em respeito à proteção do átrio jurídico perfeito. Logo, o entendimento da AGU é de que a regra não se aplica ao direito administrativo sancionador (Parecer n. 00002/2023/CNLCA/CGU/AGU).

Na contramão da orientação da AGU, o STJ tem entendimento pacificado de que se aplica a retroatividade benigna, em sede de Direito Administrativo sancionador. Vemos então que essa é uma questão muito controversa e que trará muita discussão futuramente.

Até que esses entendimentos sejam uniformizados, a Administração Pública deverá buscar soluções eficientes e inteligentes para fundamentar seus processos sancionadores, de modo a buscar sempre a melhor saída, com o devido suporte legal.


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