*Artigo de opinião
Entenda as diferenças entre anulação e revogação na Nova Lei de Licitações
Este conteúdo faz parte do centro de estudos Licitações e Contratos do IBÊ
O ato de anulação e revogação em uma contratação é uma possibilidade para quem atua na área de licitações e contratos públicos e, por vezes, os agentes confundem os institutos, que possuem conceitos e efeitos diferentes. Neste artigo, abordo de forma prática a aplicação e faço uma conexão com o Projeto de Lei 2.481/2022, que altera a Lei de Processo Administrativo (Lei 9.784/1999).
Em termos práticos, a anulação de uma licitação ocorre sempre que presente o pressuposto de ilegalidade insanável, insuperável e flagrante. Na mesma seara, a revogação de uma licitação ocorre por motivo de conveniência e oportunidade, resultante de fato superveniente devidamente comprovado.
A Lei 14.133/2021 dispõe sobre esses institutos, nos seguintes termos:
Art. 71. Encerradas as fases de julgamento e habilitação, e exauridos os recursos administrativos, o processo licitatório será encaminhado à autoridade superior, que poderá:
I - determinar o retorno dos autos para saneamento de irregularidades;
II - revogar a licitação por motivo de conveniência e oportunidade;
III - proceder à anulação da licitação, de ofício ou mediante provocação de terceiros, sempre que presente ilegalidade insanável;
IV - adjudicar o objeto e homologar a licitação.
§ 1º Ao pronunciar a nulidade, a autoridade indicará expressamente os atos com vícios insanáveis, tornando sem efeito todos os subsequentes que deles dependam, e dará ensejo à apuração de responsabilidade de quem lhes tenha dado causa.
§ 2º O motivo determinante para a revogação do processo licitatório deverá ser resultante de fato superveniente devidamente comprovado.
§ 3º Nos casos de anulação e revogação, deverá ser assegurada a prévia manifestação dos interessados.
§ 4º O disposto neste artigo será aplicado, no que couber, à contratação direta e aos procedimentos auxiliares da licitação.
Como visto acima, o ato de anular uma licitação enseja a abertura de processo administrativo de apuração de responsabilidade e a revogação deve ser devidamente comprovada com o fato superveniente.
Ainda, o dispositivo legal determina que deve ser assegurada a prévia manifestação dos interessados, contudo, a lei não define ou limita quem são os interessados. Assim, defendo a tese de que o interessado neste parágrafo extravasa a esfera dos licitantes, incluindo toda e qualquer pessoa física e jurídica, cidadão ou não, chegando até aos demandantes, beneficiários, usuários e a própria Administração. O desafio e a provocação estão em como fazer.
Nessa seara ainda, define a mesma lei que dos atos de anulação e revogação da licitação cabem recurso no prazo de 3 dias úteis:
Art. 165. Dos atos da Administração decorrentes da aplicação desta Lei cabem:
I - recurso, no prazo de 3 (três) dias úteis, contado da data de intimação ou de lavratura da ata, em face de:
a) ato que defira ou indefira pedido de pré-qualificação de interessado ou de inscrição em registro cadastral, sua alteração ou cancelamento;
b) julgamento das propostas;
c) ato de habilitação ou inabilitação de licitante;
d) anulação ou revogação da licitação;
Até aqui nenhuma novidade. Contudo, o Projeto de Lei 2.481/2022, que altera a Lei de Processo Administrativo (Lei 9.784/1999), aprovado pelo Senado Federal, enviado para apreciação da Câmara dos Deputados, traz uma sutileza acerca da importância de envolver os interessados quando da anulação e revogação de uma licitação. Segue trecho do Projeto de Lei:
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, observado o disposto no art. 55 desta Lei, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.
§ 1º Ao decidir sobre a necessidade de anulação, revogação ou convalidação de seus atos, a Administração deverá observar as regras contidas no Decreto-Lei nº 4.657, de 1942, bem como assegurar ao beneficiário do ato a oportunidade de se manifestar previamente.
§ 2º Na anulação de licitações, de concursos públicos ou de outros procedimentos em que haja mais de dez pessoas afetadas diretamente, a intimação prévia dos interessados poderá ser feita por meio de publicação no Diário Oficial ou no sítio eletrônico da instituição em local visível e de fácil acesso.
§ 3º Por razões de segurança jurídica, o administrador poderá decidir que a revogação só produza efeitos em momento futuro. (NR)
Não quero adentrar no mérito das emendas e possíveis alterações do texto, contudo, recomendável é que, nos casos de anulação e revogação, o agente de contratação ou pregoeiro assegure de forma prática a prévia manifestação dos interessados, com previsão no Edital e oficiando as áreas interessadas da Administração, como demandante, beneficiários e envolvidos. Nesse sentido, exemplifico uma possível previsão no Edital, bem como despacho via chat:
Exemplo:
DOS RECURSOS
A interposição de recurso referente ao julgamento das propostas, à habilitação ou inabilitação de licitantes, à anulação ou revogação da licitação, observará o disposto no art. 165 da Lei nº 14.133, de 2021.
Nos casos de anulação e revogação a intenção de recorrer deverá ser manifestada imediatamente, sob pena de preclusão;
o prazo para a manifestação da intenção de recorrer não será inferior a 10 (dez) minutos.
o prazo para apresentação das razões recursais será iniciado na data de intimação ou de lavratura da ata de anulação e revogação;
O prazo recursal é de 3 (três) dias úteis, contados da data de intimação ou de lavratura da ata.
Chat:
Nos termos do § 3º do art. 71 da Lei 14.133/2021 OU do item XX do Edital, convoco os interessados no prazo de XX minutos a se manifestarem acerca da revogação OU anulação do item XX da licitação. A intenção de recorrer deverá ser manifestada imediatamente, sob pena de preclusão.
Com intenção de recorrer:
Diante da manifestação de recorrer da XXX, declaro aberto o prazo de 3 (três) dias úteis para apresentação das razões recursais.
Sem intenção de recorrer:
Diante da ausência da manifestação de recorrer por parte dos interessados, declaro encerrado o certame.
Conclusão
Como diz o velho ditado: é melhor pecar pelo excesso do que pela falta de cuidados. Ou seja, entendo que o arcabouço normativo vem apontando em assegurar aos interessados a manifestação nos casos de anulação e revogação da licitação. Como você faz isso no seu órgão? Pensem nisso!
Autoria: Maike Marques é administrador, formado pela Pontifícia Universidade Católica - PUC Campinas (2008). MBA em Gestão Pública, pela UniBF (2021). Oficial da reserva do Exército Brasileiro (2018), com mais de 10 anos de experiência na área de contratação pública. Pregoeiro e especialista na área de licitações e contratos públicos, com amplo conhecimento no Portal de Compras do Governo Federal.
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Maike MarquesTags:
Gestão Pública, Licitações e Contratos, Nova Lei de Licitações