*Artigo de opinião
Entenda quais são os principais desafios na Gestão Pública
É só uma semana normal na vida de quem quer inovar no setor público.
O dia mal começou e já haviam 36 mensagens não lidas naquele grupo sobre inovação no setor público. Era o dia seguinte de um evento em que boa parte dos integrantes haviam participado e não se falava de outra coisa:
Para Beatriz já era a quarta vez em um evento sobre inovação e ela sentia que já era hora de fazer alguma coisa:
É isso. Chegando no trabalho vou fazer um pedido formal para que possamos criar um núcleo de inovação no meu setor.
Claro, quando uma pessoa inovadora se sente forte para começar não há força da natureza que a impeça de fazer. Da natureza!
Mas, como tudo com que lidamos no setor público, temos a burocracia. Não aquela que sai da boca das pessoas como um sinônimo de rígido ou confuso. É a burocracia em sua essência: as normas, regras e padrões que mantêm a unidade de uma estrutura de gestão.
Beatriz chegou e sem demora já foi procurando uma colega advogada - a Cintia -, que disse:
Você quer pedir ao nosso Secretário para criar uma unidade administrativa que vai coordenar ações de inovação em nosso órgão, então, sugiro que você dê uma olhada nisso...
...a Portaria Imaginária 21/2014, no art. 72A impõe que: “iniciativas que impliquem em criação, suspensão, extinção, aglutinação, desmembramento ou situação correlata a respeito de unidades administrativas de qualquer natureza, devem ser instruídas por meio de ofício ao secretário da referida pasta e submetidas ao parecer da área técnica destinada a avaliar a pertinência do pedido.”
E lá foi a Bia criar o tal processo no sistema. Pronto, já tem até um número: 2023000000999999. Processo enviado, agora é aguardar aquela formalidade habitual: um parecer da Gerência Fictícia para Assuntos de Estrutura de Gestão validando o pedido e dando andamento.
3 dias depois
Bia: Hum, o processo voltou... deixa-me ver
GFAEG: Em atenção ao pedido de criação do Núcleo de Inovação Pública da Secretaria Inexistente de Governança temos a informar que a senhora deverá anexar a este processo em até 48 horas descrição detalhada da unidade nos termos da Instrução Normativa Fictícia 116/1998, artigos 23, 26 e 39.
Então, no artigo 23 da INF 116/98, ela leu: “a unidade proposta deve ter o detalhamento de suas atividades”. No 26 ainda dizia: “as atividades de que trata o art. 23 devem estar alinhadas ao Regulamento Interno quanto às competências da unidade administrativa a que esteja subordinada”. Finalmente, no 39 estava escrito: “unidade cuja finalidade não se enquadre nas competências previamente descritas em Regulamento, terão a sua criação condicionada às alterações do referido Regulamento, permanecendo suspensas até sua alteração e publicação. ”
Parecia então que era o fim para a Bia. Afinal, como propor a criação de um Núcleo de Inovação, cuja existência era inimaginável 2 anos atrás? E mais: como começar a inovar se as próprias normas impediam o servidor público de propor a mudança?
Desistir não é uma opção
Foi um final de semana de muita reflexão. Afinal, desistir não era uma possibilidade.
Na verdade, desistir seria quase como enterrar aquilo que lhe dava fôlego e propósito. Bia acredita que pode fazer diferente e conquistar mais pessoas para a inovação. Então, ela pensou:
Talvez seja melhor começar de maneira informal mesmo, promovendo a conversa com as pessoas que queiram ajudar a resolver os problemas de uma forma diferente de como tem sido.
Vou começar a convidar as pessoas para os eventos e ações das quais tenho participado. Assim elas começam a ver que inovação é sobre resolver problemas e entregar valor.
E se pudéssemos formar pessoas para a inovação em governo? Desse modo as pessoas começam a ver que inovar tem método e traz resultado.
E por falar em resultado, quem sabe não conseguimos começar de alguma forma por aqui e ir mostrando que a inovação no setor público promove mudanças mensuráveis e para melhor.
Não se sinta só
Bia, ninguém disse que ia ser fácil. Somos uma rede de servidores e servidoras que quer entregar serviços e políticas públicas que melhorem a vida das pessoas.
Somos pessoas enfrentando normas antigas, talvez até boas para a época de sua criação, mas que hoje, com um mundo tão rápido e exponencial, parece uma âncora para a adaptabilidade que esse século requer, principalmente depois da pandemia.
O sistema público realmente ainda não está preparado para se abrir tão rapidamente à inovação. Sei que dá agonia pois sua mente está no presente e futuro, mas tenha paciência com o sistema. Ele não é mais tão jovem e precisa de um tempinho maior para entender o que nossa geração está falando e propondo. A mudança começará mesmo em nós. E não é fácil sermos pioneiros.
Se sentir só por um instante é só chamar.
Este texto é baseado em minha vivência na inovação em governo e inspirado pela força e coragem dos companheiros e companheiras de trabalho no LA-BORA gov!
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Autor:
Francisco Pereira