O Estado como comprador e a sustentabilidade nas contratações públicas

Isabela Montoro

28 out, 2021 ● 6 minutos

Maria Sonia Lopes da Silva explica por que a dimensão da sustentabilidade é imprescindível às contratações públicas

Hoje é Dia do(a) Servidor(a) Público(a) e, nesta matéria, o IBÊ contou com a participação da ilustríssima Maria Sonia Lopes da Silva, servidora pública da Embrapa, criadora do Projeto ZonBarragem e destaque na categoria Meio Ambiente do Prêmio Espírito Público em 2020!

Um papo para lá de especial – e imperdível – sobre sustentabilidade, contratações públicas e sua atuação essencial enquanto servidora pública e pesquisadora da Embrapa. Confira!

PERGUNTA: O IBEGESP é um Instituto focado na educação e na inovação, tendo formado mais de 100 mil servidores públicos. Durante nossa trajetória, falamos - e ensinamos - muito sobre as licitações. Embora seja um assunto técnico, que muitos querem “passar longe”, nós gostamos muito de enfatizar que elas são um dos principais instrumentos para a realização de políticas públicas e permeiam o cotidiano de todas as pessoas. Como você correlaciona esse tema com a sua área de atuação?

RESPOSTA: Para a minha área de atuação, a licitação é fundamental, pois consiste no processo por meio do qual nossa empresa contrata obras, serviços e compras para nossos projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação. Em outras palavras, a licitação é a forma como a Embrapa, que é um órgão público, pode comprar e contratar. Através da licitação temos condições de selecionar propostas mais vantajosas, em qualidade como em preço, garantir igualdade de condições a todos que queiram vender para nossa empresa/projetos, promovendo o desenvolvimento nacional sustentável.

PERGUNTA: Segundo a Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P), as contratações de bens e serviços do governo brasileiro representam, anualmente, cerca de 15% a 20% do PIB, o que evidencia o seu grande poder de compra. Daí a importância de se falar e cobrar cada vez mais comprometimento das empresas contratadas com as questões ambientais e de sustentabilidade. Como você, enquanto servidora pública da Embrapa e pesquisadora, enxerga isso?

RESPOSTA: Não entendo muito desta área, pois ela fica sob responsabilidade da área administrativa, mas considero que o setor de compras deve ser dotado de capacidade para buscar soluções inteligentes e não apenas operacionalizar aquisições. E as dimensões da sustentabilidade e da inovação devem fazer parte do processo de aquisições, sendo essencial a convergência entre o controle e a possibilidade de dinamizar e agilizar as compras públicas. Os órgãos públicos devem selecionar fornecedores não só pelos requisitos convencionais, previstos na legislação específica, mas também por critérios que privilegiem produtos ou serviços que gerem menos impactos negativos ao meio ambiente.

PERGUNTA: Em 2019, você criou o projeto ZonBarragem. No que consiste esse projeto e qual a sua importância?

RESPOSTA: O ZonBarragem Alagoas tem como objetivo impulsionar a captação e a estocagem da água de chuva em áreas de barragem subterrânea, por meio do zoneamento de áreas adequadas para a implantação dessa tecnologia nas mesorregiões do Agreste e Sertão de Alagoas, visando subsidiar a tomada de decisão em programas de políticas públicas voltados à inserção social e produtiva de famílias de agroecossistemas de base familiar. A segurança do mapa produzido pelo projeto tem viabilizado sistemas agrícolas mais produtivos, ajudando as unidades agrícolas a resistirem significativamente às intempéries climáticas do Semiárido. 

A indicação de ambientes potenciais para a construção da tecnologia social hídrica barragem subterrânea, agrupando áreas relativamente homogêneas, a partir de indicadores de geologia, solo, vegetação, relevo e clima, é subsídio às Políticas Públicas na região Semiárida. O estudo abrange uma área de 12.581 km², contemplando cerca de 1.500 beneficiários, distribuídos em 38 municípios. 

O mapa elaborado disponibiliza informações que estão auxiliando os governos estaduais e municipais de Alagoas no planejamento da ocupação dos ambientes mais adequados para construção de barragens subterrâneas de forma integrada com a aptidão das terras. Nesse sentido, vale destacar que Alagoas é o primeiro estado do Semiárido brasileiro a realizar o referido zoneamento, o que o torna referência no uso e manejo adequado dessa tecnologia, bem como base para estudos em outros estados da região. 

A implantação de barragens subterrâneas a partir do Mapa ZonBarragem proporcionará o codesenvolvimento e/ou aprimoramento de sistemas de manejo da água, solo e cultivos, aumentando a sustentabilidade de arranjos produtivos locais e fortalecendo a reprodução social, econômica e ecológica das famílias agricultoras do Semiárido alagoano, tornando-as resilientes, estáveis e menos dependentes de políticas compensatórias.

PERGUNTA: Em 2020, você foi destaque na categoria Meio Ambiente do Prêmio Espírito Público. O que esse reconhecimento representou para você? Nos conte um pouquinho sobre essa experiência.

RESPOSTA: O Prêmio deu visibilidade à minha trajetória de trabalho desenvolvida no meio rural do Semiárido do Nordeste brasileiro, que tem impactado positivamente populações socialmente vulneráveis na sua capacidade de reprodução social e econômica com sustentabilidade.

Além disso, ajudou a desmitificar o estigma de que o profissional público é improdutivo, demonstrando que existem profissionais do setor público que estão, com seu trabalho, possibilitando às famílias do Semiárido do Nordeste transformações socioecológicas, tornando-as mais resistentes às intempéries climáticas da região, com inclusão socioprodutiva focada na dignidade e autonomia. 

Por fim, o Prêmio Espírito Público é um ambiente favorável para a troca de conhecimentos, processos, serviços e soluções tecnológicas com profissionais públicos de todo Brasil.  

PERGUNTA: Por fim, qual recado você gostaria de deixar às servidoras e servidores públicos no dia 28/10 (data em que se celebra a importância da profissão)?

RESPOSTA: Nós, servidores e servidoras públicas, temos um compromisso muito grande com a sociedade, porque somos nós quem mantemos toda a engrenagem pública funcionando, independentemente dos governos que são eleitos. 

Nosso papel ainda pode ser mais preponderante quando pensamos também em ajudar as comunidades mais necessitadas. No meu caso, os agricultores e agricultoras familiares são o público com o qual tenho mais prazer em trabalhar. Por isso, procuro direcionar minhas pesquisas científicas para melhorar a vida das pessoas.